sexta-feira, 29 de março de 2013

Páscoa


Um dos discípulos não acredita no que vê. Seus olhos só enxergavam os lençóis e o lenço que havia sido colocado sobre a cabeça de Jesus.
Porém, o outro discípulo, “viu e creu” – João 20.8.
Duas atitudes sobre um mesmo fato.
Todavia, o texto de Atos 10.34-43, nos indica que é possível mudar de opinião – o apóstolo Pedro que não havia acreditado que Jesus havia ressuscitado, naquela manhã, passa a anunciar: “a este ressuscitou Deus no terceiro dia e concedeu que fosse manifesto” vs. 40. Pedro anuncia que era uma das testemunhas da ressurreição de Jesus, ao romano Cornélio, apresentado como “homem reto e temente a Deus e tendo bom testemunho de toda a nação judaica” – vs. 22, como que querendo dizer, que se Cornélio estivesse junto ao túmulo vazio, naquela manhã de domingo, ele creria, assim como João, o “outro discípulo” – João 20.4,5.
A vida de Pedro, realmente, foi transformada depois que creu.
O texto nos deixa a entender que aquele que crê passa logo a comunicar a fé, para todas as pessoas, indiscriminada e livremente, pois “reconhece, por verdade, que Deus não faz acepção de pessoas (...) por meio do nome de Jesus, todo aquele que nele crê recebe remissão de pecados” – Atos 10.34.
De fato, a transformação na vida de Pedro foi muito grande!
Anuncia a um romano que Deus tem a mesma disposição que teve para com ele – se Deus perdoa os pecados de todo aquele que crê em Jesus, mesmo daquele que não acreditou de imediato, apesar de ver os sinais da Sua ausência, também, de um romano que creu nAquele que “andou por toda parte, fazendo o bem e curando a todos os oprimidos do diabo” – vs. 38; e, isto sendo anunciado pelo judeu Pedro, demonstra o quanto sua visão de vida sofrera transformação.
Pedro poderia ter levado Cornélio a se sentir culpado pela crucificação de Jesus, pois como centurião romano obedecia a ordens do governador de Roma que reinava em Israel, e que teve participação direta no julgamento e condenação de Jesus à morte.
No entanto, Pedro apela a Cornélio que considerasse que Jesus fora “pendurado no madeiro”, porque andou por toda a parte fazendo o bem.
Pedro levou Cornélio a enxergar os sinais de Jesus, assim como vira os lençóis e o lenço no sepulcro, e não havia se lembrado do bem que Jesus havia feito, e que tantas vezes ele havia presenciado.
A ressurreição de Jesus transformou o judeu Pedro, o que o levou a aprender a fazer o bem ao romano Cornélio, deixando de lado o seu orgulho, o seu egoísmo, o seu sentimento de se ver grande e melhor do que os outros.
Fazer o bem aos outros, é sinal de que acreditamos no Jesus que não está no túmulo.
Afinal, é esta a mensagem de Paulo aos coríntios – I Coríntios 5.6-8 – “Não é boa a vossa jactância” – Paulo vê que a arrogância é o grande empecilho para celebrar a festa da Páscoa.
O Apóstolo Paulo compara a arrogância ao fermento, que por mínima quantidade que seja, pode fazer com que a pessoa se sinta tão superior aos demais que não percebe que não é ela que se justifica dos seus pecados, mas sim “Cristo, nosso Cordeiro Pascal, imolado” – vs. 7.
E, ensina a “lançar fora (...) o fermento da maldade e da malícia”, antes “celebremos a festa com os asmos da sinceridade e da verdade” – vs. 8.
Os “asmos da sinceridade e da verdade” precisam comidos por nós mesmos, quer dizer, sermos sinceros e verdadeiros para conosco mesmos, para percebermos o quanto somos tão imperfeitos quanto aqueles que julgamos e condenamos.
Só quem é sincero e verdadeiro consigo mesmo, sabe o quanto é importante fazer o bem aos outros, e principalmente àqueles considerados inferiores aos seus olhos, porém, para Deus não é diferente, antes, recebe dEle o mesmo amor e perdão, pois do contrário não poderíamos crer nEle.
O texto de João 20.1.9 nos apresenta pessoas que se formos arrogantes, facilmente as consideramos inferiores a nós: Maria Madalena prostituta convertida, Pedro um iletrado, João um pescador.
Os três são apontados pelo texto bíblico como “ainda não tinham compreendido a Escritura, que era necessário ressuscitar ele dentre os mortos” – vs. 9.
Maria Madalena, diante do túmulo aberto, disse: “Tiraram do sepulcro o Senhor, e não sabemos onde o puseram”;
Pedro e João correram juntos, e diante do mesmo cenário, têm reações tão diferentes: um vê e crê, o outro só vê, e procura entender, mas não entende, e os dois voltam para casa, e Madalena “permanece junto à entrada do túmulo, chorando. Viu Jesus em pé, mas não reconheceu que era Jesus, suponha ser Ele o jardineiro” – vs. 10, 11, 14, 15.
Dá para ver o quanto somos parecidos com eles?
Perguntemo-nos: considerando as grosseiras e públicas fraquezas de Maria Madalena, Pedro e João, teriam eles chances de ganharem a nossa aproximação, e amizade?
Espero que sim, pois compartilhamos da mesma natureza humana deles; e se eles podem, eu também posso, e você também pode se aproximar e ser amigo de quem quer que seja.
A pressa de compreender as coisas nos prejudica.
Queremos que tudo seja explicado - não toleramos dúvidas, porque temos medo de nos sentir inferiores aos outros.
Quanta preocupação com as certezas, só para nos sentirmos melhor que os outros!
Como pode o “conhecimento” nos deixar tão cheio de nós mesmos! E, onde fica: “Deus não faz acepção de pessoas; pelo contrário, em qualquer nação, aquele que o teme e faz o que é justo lhe é aceitável”?
Quem deve julgar se o que é feito pelos outros é justo ou não, aceitável ou não, é Deus, pois Ele é o único que pode julgar!
Quem somos nós para julgar?
A nós nos cabe comer o pão da sinceridade e da verdade conosco mesmos.
Maria Madalena, Pedro e João, se alimentavam deste pão, principalmente depois de terem se convertido ao Senhor.
E, você, tem comido deste pão?
Lembre-se de se alimentar do “Cordeiro Pascal” – Jesus morreu para que os seus pecados fossem perdoados, e para que os pecados dos outros, também fossem perdoados.
O “Cordeiro Pascal” é alimento para todas as pessoas, que se veem necessitadas do perdão de Deus, porque se percebem imperfeitas, grosseiras, baixas, incapazes de acertar sempre.
“Celebremos a festa não com o velho fermento, nem com o fermento da maldade e da malícia, e sim com os asmos da sinceridade e da verdade” – I Coríntios 5.8.
Aprofundemos ainda mais o sentido destas palavras: Não estariam elas nos desafiando a passar diariamente pela experiência da Ressurreição?
“Celebrar a festa não com o velho fermento”, significa, diariamente, transformar a falta de educação em ternura, a insatisfação em contentamento, a mentira em verdade, a dissimulação em honestidade, a maldade em caridade, a opressão em liberdade, a indiferença em solidariedade.
“Celebrar a festa não com o fermento da maldade e da malícia”, significa que diariamente precisamos transformar a nossa sede por recompensas em reflexão, de cinismo em vergonha, de perseguições em acolhimento, de exploração em amizade, de moralismos em tolerância, de preconceito em convivência, de discriminação em intercessão, de maledicência em bem-dizer.
“Celebrar a festa não com o velho fermento”, também significa se empenhar de fazer da melancolia, prazer; da inveja, alegria; da morbidez, beleza; daquilo que é trágico, em utopias; das perdas, conquistas; da altivez, humildade; da arrogância, simplicidade; da ambição, igualdade; do consumismo, sentido de vida; das exigências aos outros, autocrítica.
“Celebrar a festa com os asmos da sinceridade e da verdade”, significa, entre outras coisas: transformar ocupação em lazer, extinção em preservação, traição em diálogo, reducionismo em memorial, imediatismo em paciência, iconografia em história, grotesco em cordialidade, fundamentalismos em diversidades, sensacionalismo em conteúdo, midiático em bom-senso, corrupção em temor, desigualdade em fraternidade, intolerância em paz, autoajuda em sabedoria, técnica em proximidade, esoterismo em espiritualidade, enganos em acertos, isolamento em pertencimento, ter em ser, descartável em permanência, alienação em consciência, banalização em valores, magia em espera, igreja em religião/espiritualidade, relativismo em padrão ético, morte em vida.
“Lançai fora o velho fermento, para que sejais nova massa, como sois, de fato, sem fermento. Pois também Cristo, nosso Cordeiro Pascal, foi imolado.” – I Coríntios 5.7 – Nisto está o sentido da Páscoa experimentado por Pedro, Cornélio, Paulo, Maria Madalena, João, os coríntios – eles se transformaram em “nova massa”.
Oxalá, eu e você, também!
Boa Páscoa!

sábado, 9 de março de 2013

O êxodo do Egito e o Filho pródigo: mais que semelhanças


Lucas 15.1-3, 11-32 – nos conta a Parábola do Pai que gastou todo seu amor ao filho que retornou à sua casa; mas, pode ser entendida como uma ilustração do povo de Israel que saiu do Egito e chegou à terra da Canaã.
1. O filho em terra distante, na qual padeceu fome e sofreu necessidades – vs. 13-14, ilustra o povo de Israel que no Egito passou por grandes necessidades;
2. Na terra distante, um dos cidadãos daquela terra, mandou o rapaz, guardar os porcos – trabalho humilhante, realizado apenas por escravos – vs. 15, isto é muito semelhante à vergonha ultrajante da escravidão que Israel sofreu no Egito;
3. Aquele filho não recebeu nada dos habitantes da terra, ilustra muito bem o tratamento recebido por Israel, durante os 400 anos que vivera no Egito;
4. Sua oração – vs. 17-19, ilustra o clamor dos filhos de Israel, que gemiam e clamavam devido ao sofrimento;
5. No vs. 20, diz que o moço levantou-se e foi para seu pai, representa a imagem da saída do povo do Egito e seu retorno à terra de Canaã;
6. O vs. 20 ainda nos diz: “Vinha ele ainda longe, quando seu pai o avistou, e, compadecido dele, correndo o abraçou, e beijou” – é como se Jesus se referisse às atitudes tomadas por Deus ao libertar o Seu povo do Egito, levando-o à terra que mana leite e mel, que simboliza o seu abraço e beijo, seu cuidado amoroso, atendendo cada uma das suas necessidades;
7. Os vs. 22-24, faz referência ao Pai que providenciou ao filho - “a melhor roupa, pôs em seu dedo um anel e calçou-o com sandálias, mandou matar o novilho cevado e o comeram e, regozijaram-se porque seu filho que estava morto, reviveu, que estava perdido, foi achado”, ilustrando ao que lemos em Josué 5.9 – “Hoje, removi de vós o opróbrio do Egito”. Assim como fez o pai ao seu filho, Deus também pôs fim às necessidades do povo de Israel: de escravos passaram a ter uma condição digna de vida; de humilhados passaram a ser o centro de todas as atenções – o povo-filho foi resgatado.
O novilho cevado que o filho comeu naquele dia em companhia do pai foi a páscoa que os filhos de Israel comeram quando saíram do Egito. E, o regozijo do pai pelo retorno à sua casa do seu filho mais novo, ilustra bastante bem, que depois que os filhos de Israel chegaram à sua terra de Canaã, comeram lá das suas novidades;
8. Mas, e o filho mais velho, que estivera no campo e ao aproximar-se da casa, ouviu a música e as danças, e ficou indignado e não quis entrar, além de responder ao pai, que ele sim, o servia a tantos anos sem jamais ter desobedecido uma ordem sequer, enquanto que ele estava desperdiçando seus bens com alguém, seu irmão, que não merecia nada, é semelhante a quê? – vs. 25-30.
1. Se refere às nossas atitudes, pois apesar de Deus ter feito tudo por nós, ainda assim vivemos como se estivéssemos no Egito;
2. Ilustra nossa atitude, de apesar sabermos que Deus ouve nossos clamores, ainda assim não clamamos por Ele;
3. Fala a respeito de nossa atitude, que apesar de Deus tomar as providências, às vezes as mais espantosas, para nos livrar de nossas necessidades, ainda assim achamos que é pouco e, que mereceríamos que Ele fizesse algo maior do que tem feito, só porque somos nós, enquanto que para os outros, Deus é melhor do que para nós;
4. Se refere à nossa atitude, de permanecermos no lugar que estamos, e de não querermos nos levantar e ir ao encontro do Pai, e assim mesmo, querendo que aconteça um êxodo, uma mudança de vida, porém desde que tudo continue da mesma maneira, porque nos acostumamos ou nos adaptamos tanto ao estado que nos encontramos que não queremos voltar ao Pai, porque para o êxodo acontecer, temos de mudar interiormente, e qualquer mudança interior a entendemos como desconfortável, que segundo a parábola trata-se do “cair em si”. E, nos recusamos a “cair em si”, e ficamos indiferentes à nossa situação espiritual ainda que continuemos gemendo e gritando de fome;
5. Ilustra, ainda, nossa atitude para com o próprio Deus, que mesmo tendo apressadamente tomado todas as providências, e todos os dias se compadece de nós, corre ao nosso encontro, abraça-nos e beija-nos, e ainda assim, O desprezamos, achando que merecíamos muito mais; que o que Ele faz é muito pouco, então, por que dar tudo para um Deus que faz tão pouco?;
6. Fala a respeito de nossa atitude quando não percebemos que o maná, que era o alimento provisório, é substituído pelas novidades da terra de Canaã, isto é, vivemos como se as coisas antigas ainda não tivessem passado, que Deus continua nos tratando segundo nossas transgressões, e não segundo a reconciliação que resolveu fazer conosco, nos tratar como filhos, não mais como escravos. Isto significa que, às vezes, nos relacionamos com Deus mais por medo que por amor, ao invés de gozarmos plenamente a liberdade de leis, regras e preceitos, que nos massacram e tiram nossa alegria, porque nos impõe medo e pavor;
7. Se refere à nossa ingratidão para com Deus que nos ama mesmo quando não cumprimos Suas ordens, pois Ele não estabelece condição alguma para nos amar, ao contrário, nós sim que estabelecemos condições para Ele nos amar;
8. Contudo, a parábola nos propõe que nos identifiquemos com o filho mais novo, pois nós também somos como ele:
1. Assim como ele, precisamos aprender que as situações que nos fazem sofrer e gemer são precisamente aquelas que nós mesmos criamos, devido às nossas fraquezas, pois carregamos em nós o “cidadão que nos manda guardar seus porcos”, e isto significa que precisamos nos conscientizar que não passam de “porcos” as fraquezas que nos humilham, mas que precisam de nossa atenção e cuidado, pois se negligenciarmos nossas fraquezas, nós morremos;
2. Apesar de ser muito humilhante assumirmos que temos “fraquezas”, é melhor assumirmos esta condição, e apresentarmos cada uma delas, em clamor e gritos Àquele que segundo o Salmo 34:
livra-nos de todos os nossos temores – vs. 4;
ouve nosso clamor aflito e nos livra das tribulações – vs. 6, 17;
tem Seus olhos voltados para nós e ouvidos estão abertos ao nosso clamor – vs. 15;
mesmo que as aflições sejam muitas, de todas Ele nos livra – vs. 19;
nosso Deus nos resgata nossa alma – vs. 21;
3. O filho mais novo viveu intensamente as palavras do Apóstolo Paulo – II Coríntios 5.17-21 – ao voltar à casa do pai ele se reconciliou com seu pai, isto é, ele experimentou uma alteração interior, já não era mais aquele que havia saído de casa, passou a ser uma nova pessoa por dentro, “se alguém está em Cristo, é nova criatura; as coisas antigas já passaram; eis que se fizeram novas”;
4. Por tudo que passamos: sendo escravos do egoísmo, tão cheios de nós mesmos, temos de sentir que precisamos experimentar uma mudança por dentro, para comermos as novidades da terra de Canaã, da festa do Pai;
5. Precisamos saber que enquanto permanecermos em nossa própria miséria, além de passarmos fome, não há alguém que possa nos dar alguma coisa. Ou seja, se não tomarmos uma atitude por nossa própria conta, ninguém fará por nós. Por melhores que sejam nossos amigos, familiares, ou qualquer recurso que possamos ter: dinheiro, prestígio, moral, sucesso, bens, confissão religiosa, etc, mas, se não tivermos vontade para sairmos da situação que nos encontramos, escravizados pelas nossas fraquezas, nada virá ao nosso encontro. Temos que “cair em nós mesmos”, isto é, refletirmos, considerarmos sincera e seriamente nossa real condição, e com vontade clamarmos a Deus que vem ao nosso encontro correndo, com paciência, e nos recebe de braços abertos e quer nos beijar, porque nossa estrutura é pó;
6. A mudança interior que precisamos que aconteça em nós é nos entregarmos aos abraços e aos beijos do Pai, isto é, vivermos plenamente a liberdade para a qual o Senhor nos chamou. A liberdade não substitui a obediência, ao contrário, a liberdade para a qual o Senhor nos chama a vivermos diariamente é para justamente não mais ficarmos cultivando o pensamento dominado pelas nossas fraquezas, mas confiarmos ao Seu amor, caso caiamos em nossas fraquezas;
7. A liberdade não é para fazer com que o escravo faça o que bem entende, mas sim que pelo cuidado amoroso que o Senhor dispensa a nós, nós O amemos, nos relacionemos com Ele como filhos;
8. O filho não é escravo. O escravo teme o seu senhor, o filho procura imitar o pai. O escravo espera receber alguma coisa do seu senhor, o filho desfruta dos bens do pai, porque é tudo dele. O escravo cumpre ordens, o filho se alegra com a presença do pai que lhe diz: “Meu filho, tu sempre estás comigo”. O escravo sabe que nunca será filho, o filho vive tranquilo e por isso pode se alegrar porque ainda que saia de casa, ao voltar, continua filho, não perde jamais esta condição e, portanto, mesmo sabendo disso, não deseja isso para sua vida, porque seu pai é sua alegria e regozijo, nada pode substituir o abraço e o beijo do pai;
9. Você é uma “nova criatura”, isto é, você tem uma nova vida por dentro, quando você se relaciona com o Pai, com liberdade e amor e não com temor e insegurança que nos leva a querermos barganhar o seu amor, que nos dá com liberalidade incondicional.