“O
“Deus te salve” de Gabriel não traz nenhum bem, a não ser que essa saudação seja dita a mim também” - Ângelus Silesius, pseudônimo
de Johannes Scheffler (1624-1667), poeta alemão, místico e teólogo.
Justamente
porque a história do nascimento de Jesus tem a nos fazer bem, que ela nos é narrada como:
A história do nascimento
de Jesus mostra quantos contrastes há em nós, quando nos comparamos com ela, e
o quanto ainda ela tem a nos dizer.
A simplicidade do cenário e das pessoas
desafia a nossa vida "sofisticada", "burguesa".
A
sofisticação nos distancia da naturalidade da vida humana. Temos uma capacidade
muito grande transformar nossa vida em algo artificial. Nossas relações, até os
acontecimentos que nos desagradam, somos capazes de relatar com mudanças, com
vistas a não lidarmos com os fatos tais como eles ocorreram. E, esta atitude é
reforçada, à medida que vivemos como se a vida fosse uma novela de televisão,
onde tudo é artificial e montado para dar tudo errado ou tudo certo.
Quanto
mais artificiais somos, menos gostamos da vida e menos prazer temos em viver.
O
que vemos na história do nascimento de Jesus, é que os relatos foram
registrados, sem artificialidade, sem seguir um script de um diretor que
pretende agradar a audiência, mas com a simplicidade do acontecimento e das
pessoas envolvidas.
Outro contraste da história do nascimento
de Jesus, é que acreditamos que sozinhos conseguimos o que queremos.
Não
tem pensamento mais contrário à história do Natal, do que este. Pois ela nos
conta o encontro de uma família, que mesmo sendo inexperiente, o casal e seu
filho, vencem juntos as adversidades. Poderíamos dizer, que para os padrões de
hoje, José e Maria, seriam até ingênuos, pelo que dá a entender nas
entrelinhas, pelo menos eram mais puros do que nós, porque não eram
artificiais, e por isso venceram juntos as dificuldades que apareceram à frente
deles.
Eles
não pensavam que sozinhos conseguiriam o que queriam. Se José era homem justo e
se não queria difamar Maria, por uma gravidez que não teve envolvimento, estava
diante da necessidade de ficar junto de Maria, mesmo que tivesse resolvido
desmanchar o contrato de casamento sem que ninguém soubesse. E, Maria quando
viu que não podia passar por aquela experiência sozinha, porque tinha muito
medo, mas mesmo assustada, segurou-se numa Palavra que lhe garantia de
que o impossível era possível acontecer, e buscou ajuda, primeiramente em sua
prima Isabel, que a encorajou para ficar firme no que tinha que passar. Mas,
depois, talvez passado o susto, valorizou José ao seu lado, que compreendeu o
que acontecia, e aceita por ele, teve forças para enfrentar o que vinha pela
frente.
A história do nascimento de Jesus nos
mostra outro contraste com o modo como vivemos a nossa vida: a indiferença para
com os que necessitam mais que nós.
Se bem que deste,
não nos diferenciamos muito – trata-se, dos donos das hospedarias, onde Maria e
José buscaram abrigo. É uma pena, que nos identificamos com os donos das
hospedarias, que negaram um lugar mais decente, para o menino nascer.
Porque
não havia lugar para eles na hospedaria, Jesus nasceu numa cocheira e seu berço
foi um cocho, onde os animais se alimentavam.
Como
membros da classe média, chamada também de burguesia, o contraste da nossa vida
com a história do nascimento de Jesus, é quando nos vemos como consumidores dos
produtos ligados à festa natalina, e não mais ao espírito do Natal.
O
consumo dos produtos da Festa nos distancia do espírito de solidariedade para
com os que têm menos, ou nada do que temos.
Como
os donos das pensões, que não consideraram que ainda que se tratava de uma
mulher desconhecida, mas que estava grávida, e que tinha direito, como todas as
outras mulheres que já tinham sido mães, ou que como ela, também tiveram seus
filhos naquela mesma noite. Preocupados com os lucros dos seus negócios, não
tinham tempo para pensar nos outros.
Nós,
também, muitas vezes, durante o ano todo, agimos como eles, como se outras
pessoas, ainda que desconhecidas, não tivessem os mesmos direitos que temos, ou
então, não nos importamos com as necessidades deles, porque estamos tão
envolvidos em nossos próprios interesses, que não podemos nem ao menos pensar
neles.
Outro
contraste da nossa vida com a história do nascimento de Jesus: é que
as personagens da história não eram comodistas com a vida que levavam.
Nem
José, nem Maria, nem os pastores e nem os astrônomos do oriente, eram pessoas
acomodadas com a vida que levavam. Se fossem, não teríamos Natal.
O
que quero dizer, é que eram pessoas que tiveram que fazer adaptações em suas
vidas, devido às condições que se impuseram sobre eles. Nenhuma daquelas
pessoas planejou nem se quer desejou passar pelo que passaram. Todas tiveram
que abrir mão de suas próprias vontades, para só então verem o que seus olhos
tiveram o privilégio de ver.
O
mesmo conosco. Se não vemos coisas maravilhosas acontecerem em nossas vidas,
não é porque elas não acontecem, mas sim, porque não queremos nos adaptar à
vida, mas sim queremos que tudo aconteça do nosso jeito, e ai dos que nos
contrariam ou que pensam diferente de nós, e assim, ficamos incomodados e,
sempre insatisfeitos com o que nos acontece, porque exigimos muito dos outros e
de nós mesmos, coisas que bem sabemos que não têm importância, e são totalmente
irrelevantes e bem que poderiam ficar em segundo plano, e nunca serem exigidas,
como condições para sermos felizes.
A
história do nascimento de Jesus se opõe às condições que tentamos impor, para
que a vida seja do nosso jeito.
Maria
viu que não poderia ser comodista, porque Deus se impusera a ela de maneira que
não teve outro jeito senão dizer: “Eu sou a serva de Deus, que aconteça comigo
o que o Senhor quer”.
José
teve que deixar seus ideais de vida, que até então poderiam ter funcionado, mas
que agora, teriam de serem deixados de lado; sua honestidade estava sendo
provada: receber sua noiva, sem casamento e, ainda grávida.
Ah!
Se eles não tivessem compromisso com a vida!
E, os dois em Belém? Ao buscarem
um lugar para que o menino nascesse, não encontraram senão, uma cocheira e
tiveram que aceitar o que era possível. Podemos considerar que José,
possivelmente, tenha buscado ajuda em seus amigos de infância, pois havia
nascido naquela cidade, ou de gente conhecida, mas não encontrou ninguém que os
recebesse.
E,
se fossem teimosos, turrões ou comodistas, certamente teriam motivos para se
revoltarem, contra tudo e contra todos, só porque a vida não era o que achavam
que devia ser. Mas, não teimaram, não se revoltaram, mas aceitaram o que era
possível.
A
vida, às vezes, para não dizer sempre, nos coloca em situações, que o melhor a
fazer é adaptar, deixar de lado o ideal tão desejado. A realidade se impõe
sobre o ideal, e exige adaptações. E a nossa felicidade terá a medida de sermos
capazes de nos adaptar.
E,
quanto aos pastores e os astrônomos?
Se cada um deles ficasse em seus lugares,
não fossem até Belém, seriam infiéis para com a visão que tiveram, e perderiam
a oportunidade de adorar a Deus, em carne e osso.
Nós,
também, perdemos muitos privilégios, só porque não queremos sair do lugar que
estamos! E, por quê? Só porque somos comodistas. Não há outro motivo mais justo
do que este?
As
situações por piores ou mais insuportáveis que nos pareçam, nos servem para que
esperemos por algum momento melhor que nos possa acontecer, inesperadamente,
assim como foi a descida de Deus entre os homens. E, enquanto esperamos,
ganhamos paciência, assim como o menino naquela estrebaria, que ainda tinha
muito por viver e crescer. Ainda que não fosse mais que uma criança, na
manjedoura, mas que cresceria, muitos anos passaria, pelo menos 30 anos, até
então, ser levantado entre os homens, para atrair a todos que percebendo os
contrastes de suas vidas, com a vida dEle, se rendessem ao pé da cruz.
Que nosso Natal seja mais parecido com a
história do nascimento de Jesus, para que seja verdadeiramente feliz!
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